José Filipe Sepúveda da Fonseca - Deputado Municipal pelo CDS-PP
Exmo. Senhor Presidente da Assembleia Municipal,
Exmo. Senhor Presidente da Câmara Municipal de Vila Real,
Exmos. Senhores Convidados,
Exmos. Senhores Deputados,
Minhas Senhoras e Meus Senhores,
Faz hoje 36 anos, era deposto pela força das armas o regime que perdurou durante quase meio século e que abrangeu o período da Ditadura Militar, de 1926 a 1933, e o Estado Novo corporativista, que vigorou a partir de 1933, com a aprovação de uma nova Constituição, até 1974.
As expectativas criadas em vários sectores da sociedade portuguesa no período entre 1968 e 1970, também conhecido como Primavera Marcelista, fase durante a qual se verificou uma certa modernização económica e uma liberalização política moderada, faziam já antever, de alguma forma, a necessidade de mudança de regime que era desejada por muitos, e o anseio pelo restabelecimento do regime da democracia representativa que acabou por ocorrer em 1974.
Na data que hoje se comemora, seria extremamente redutor não falar das consequências ideológicas e políticas da Revolução de 25 de Abril de 1974. Dada a enorme distância temporal relativamente aos acontecimentos desse dia, torna-se um imperativo referir, ainda que de forma muito breve e retrospectiva, os momentos que, desde então e até aos nossos dias, marcaram de forma determinante a sociedade portuguesa e que contribuíram para o desenvolvimento económico e social de Portugal, ou que de alguma forma condicionaram esse mesmo desenvolvimento. Deste modo, estamos a exercer um papel pedagógico, recordando às gerações mais novas algumas realidades que nem sempre lhes são dadas a conhecer com total isenção e objectividade nos manuais escolares.
Logo após a Revolução foram grandes as expectativas que se criaram com a transição para o novo regime democrático, mas cedo os portugueses puderam aperceber-se que, tal como acontece de forma sistemática em todas as revoluções, aqueles que as protagonizam, acabam por abrir passo, consciente ou inconscientemente, às facções mais radicais que pretendem levar a cabo transformações políticas e sociais sectárias minuciosamente delineadas e implementadas.
E em Portugal isso não foi excepção.
Com efeito, perante a ignorância política de alguns sectores da sociedade portuguesa, aliada a uma doutrinação nos princípios marxistas, sobretudo entre alguns sectores da juventude, que já vinha sendo levada a cabo de forma clandestina pelo Partido Comunista, rapidamente se tentou disseminar a ideologia marxista nos liceus, universidades, nas empresas, entre os trabalhadores rurais, nas fábricas, enfim, um pouco por toda a sociedade.
O auge da investida ideológica marxista-leninista levada a cabo pelo Partido Comunista Português, aliado aos militares mais radicais, defensores de um socialismo colectivista, deu-se quando, pouco mais de um ano após a Revolução, se tentou impor a todo o país uma ditadura obediente a Moscovo, que teve como marco inicial o 11 de Março de 1975. No seguimento dos acontecimentos do 11 de Março, foi desencadeado um processo de nacionalizações de empresas do sector bancário e dos seguros, da ocupação e expropriação ilegítima de terras, em última análise a nacionalização de praticamente todo o tecido produtivo nacional.
A nacionalização prolongada de um importante conjunto de empresas estratégicas para a economia nacional e as ocupações de terras que, em muitos casos, chegaram a durar mais de 15 anos antes de serem devolvidas aos seus legítimos proprietários, deixaram o país numa situação economicamente insustentável, acabando por relegar a economia portuguesa para uma posição muito enfraquecida face a outras economias.
Não hesito em afirmar que, em grande medida, muitas das actuais fragilidades da nossa economia e a omnipresença do Estado em todas as esferas da sociedade, ainda são resquícios dessa época conturbada que se viveu, sobretudo entre 11 de Março e 25 de Novembro de 1975, data em que o país esteve à beira de uma guerra civil. Este facto foi recentemente confirmado e reconhecido por diversos e destacados membros da hierarquia das Forças Armadas, entre eles o ex-presidente da República, general Ramalho Eanes.
Com o fim dessa fase mais conturbada em termos de agitação social vivida em 1975, entrava-se num período de uma aparente normalidade política e social, embora continuasse a pairar sobre toda a sociedade, de forma muito acentuada, a marca ideológica da esquerda marxista. Foi nesse contexto que, em 1976, se aprovou a nova Constituição que vinha substituir a Constituição de 1933.
É oportuno recordar que o CDS foi o único partido que votou contra a actual Constituição, de cunho marcadamente socialista e influenciada pela conjuntura revolucionária que então se vivia.
Consideramos totalmente anacrónico e deslocado da realidade dos problemas do mundo actual que, após a VII Revisão Constitucional extraordinária de 2005, se continue a consagrar no Preâmbulo da lei fundamental que regula as garantias e os direitos dos cidadãos e a organização política do Estado, num país democrático da Europa Ocidental, uma disposição que refere: “a abertura do caminho para uma sociedade socialista.”, isto mais de 20 anos após a queda do Muro de Berlim!
É conveniente recordar que, as Constituições da generalidade dos países pertencentes ao antigo Bloco de Leste que estiveram subjugados a ditaduras totalitárias de cariz marxista, vários deles actualmente membros da União Europeia, não têm uma tal carga ideológica nem consagram qualquer disposição idêntica à que acabei de referir, situação que apenas ocorre em Portugal.
A par da omnipresença do Estado na vida privada e no tecido empresarial, Portugal vive actualmente uma grave crise no ensino, situação que deveria preocupar seriamente os agentes políticos e a sociedade civil.
O grau de desenvolvimento cultural e social de um povo deve ser avaliado em grande medida pela qualidade do ensino que é ministrado desde a escola primária. Um sistema de ensino eficaz e correctamente estruturado constitui um dos pilares de uma sociedade harmoniosa e justa.
Ora, aquilo a que se assiste actualmente em muitos estabelecimentos de ensino um pouco por todo o país, é a substituição do princípio de liberdade que pressupõe a responsabilidade, por uma atitude, muitas vezes de libertinagem em tudo contrária ao princípio da liberdade exercida com responsabilidade. Também na esfera do ensino, a propagação de teorias marxistas e uma visão marxista da História, desde 1975, acabaram por influenciar de forma decisiva os conteúdos programáticos de várias disciplinas, e de forma muito particular a disciplina de História, facto que perdura até hoje e que é confirmado, entre outras pessoas, pela insuspeita socióloga Maria Filomena Mónica.
A adesão de Portugal à CEE em 12 de Junho de 1985 vinha abrir novas perspectivas em termos de desenvolvimento económico a um país que se encontrava debilitado economicamente pelas razões atrás referidas.
A adesão à Comunidade Europeia veio trazer muitos benefícios materiais a Portugal, nomeadamente através das ajudas para a construção de vias de comunicação essenciais para um maior desenvolvimento económico de todas as regiões do território nacional. A par disso são também visíveis os resultados das ajudas comunitárias que ao longo dos vários Quadros Comunitários de Apoio têm sido dadas aos Municípios para o desenvolvimento de projectos destinados a ajudar à fixação das populações não só nos grandes centros urbanos, mas também no interior.
Apesar desse esforço de investimento no desenvolvimento do interior do país, constata-se lamentavelmente que há cada vez mais assimetrias entre o interior e o litoral. Trás-os-Montes é o exemplo mais claro dessas assimetrias, sendo no conjunto das regiões europeias, aquela que tem o PIB per capita mais baixo.
Sendo certo que, ao fim de 36 anos de democracia, não estão em causa, do ponto de vista formal, os princípios sobre os quais assenta um regime democrático, ou seja, a liberdade de opinião dos cidadãos e o direito de voto, entre outros, é certo também que a grave crise que Portugal atravessa com contornos políticos, económicos e sociais, tem reflexos num descontentamento e divórcio generalizados dos eleitores relativamente aos seus representantes, ou seja um afastamento cada vez maior entre os políticos e a sociedade civil.
Neste ambiente, sectores minoritários da esquerda radical tentam impor a sua agenda ao partido do Governo, na tentativa de implementar leis como a do chamado “casamento” homossexual, num total desrespeito pela vontade de quase 100.000 cidadãos que solicitaram um referendo a esta lei.
Tal como se refere numa recente carta aberta da Associação Acção Família ao Presidente da República, a solicitar o veto a esta lei: “…o nosso Parlamento decidiu, num gesto de inexplicável autoritarismo antidemocrático, pura e simplesmente ignorar tal pedido. É difícil afastar a impressão de que os nossos legisladores têm receio de se confrontar com o sentimento popular. O que, de si, Senhor Presidente, é bem oposto ao espírito que deve reger o chamado regime de liberdades democráticas.” E afirma-se mais adiante: “O extravasar indevido do mandato eleitoral a esses extremos transformaria o mundo político numa verdadeira seita filosófico-religiosa, incumbida de tutelar, com assomos inquisitoriais, os costumes, sentimentos e convicções dos indivíduos.”
No ano em que se comemora o centenário da implantação da República, verificamos com estranheza e até com apreensão, a forma como o Estado actual, na senda do Estado laico e socialista que vigorou na 1ª República, desrespeita o princípio da laicidade do Estado relativamente a questões como a da legislação sobre uma instituição como o casamento, anterior ao próprio Estado.
A noção de Estado laico pressupõe a neutralidade do Estado relativamente a questões morais, religiosas e civilizacionais.
Segundo a opinião de personalidades oriundas de diversos sectores da sociedade portuguesa, aquilo a que se assiste actualmente é à tentativa da imposição de uma Moral do Regime, mediante a utilização de mecanismos do Estado de Direito, para levar a cabo transformações sociais de cariz radical sobre as quais os portugueses não foram consultados e para as quais os deputados não têm objectivamente mandato do povo.
Trinta e seis anos depois da transição para a democracia, é bem o caso de nos perguntarmos se esta nova Moral do Regime que se está a tentar impor aos portugueses, não será de monta a comprometer as tão propaladas conquistas de 1974.