27 de janeiro de 2011

A maioria silenciosa de descontentes e a crise do actual sistema político em Portugal

Uma maioria silenciosa de descontentes explica a elevada abstenção nas Presidenciais e a crise do actual sistema político da Democracia portuguesa.

  Os resultados das eleições presidenciais vieram confirmar aquilo que já era previsível para muitos analistas e comentadores políticos e também para muitos portugueses. Refiro-me à elevadíssima taxa de abstenção, que desta vez atingiu um valor recorde de 53,7%, muito acima dos 35% indicados por várias projecções das agências de sondagens.

 Comecemos pelo relato dos resultados publicados no Portal do Eleitor: Cavaco Silva – 52,95% - 2.230.532 votos; Manuel Alegre – 19,76% - 832.375 votos; Fernando Nobre – 14,1% - 593.915 votos; Francisco Lopes – 7,14% - 300.874 votos; Manuel Coelho – 4,49% - 189.038 votos; Defensor Moura – 1,57% - 66.095 votos; Nulos – 1,93% - 86.532 votos; Brancos – 4,26% 191.188 votos.

 Apercebemo-nos de imediato que o actual Presidente da República foi eleito por um reduzido número de eleitores, se comparado com o universo total dos eleitores recenseados, ou seja dos praticamente 9 milhões e 430 mil eleitores, votaram em Cavaco Silva 2.230.532 eleitores, ou seja um número que não representa sequer 25% do eleitorado.

 Comecemos por analisar a abstenção. O elevado nível de abstenção nesta eleição é preocupante e revelador da falta de saúde da nossa Democracia.

 Repete-se incansavelmente que um dos benefícios da Democracia é o direito de poder escolher livremente os governantes. No entanto, não podemos deixar de questionar-nos sobre o que tem corroído a nossa Democracia, quando mais de metade dos eleitores renuncia a escolher o Chefe de Estado.

 Não se pode afirmar que todos os que se abstiveram o tenham feito pela mesma razão, mas sem sombra de dúvidas que a maior parte o terá feito por desinteresse ou para manifestar o seu desagrado com a vida política tal como tem vindo a ser conduzida nos últimos anos, e também pela falta de representatividade dos políticos.

 Alguém poderá ver neste elevado grau de abstenção um mero desinteresse pela vida pública.

 Fica-se com a impressão de que este desinteresse é mais complexo do que parece à primeira vista. Creio poder afirmar-se que, na opinião pública, há uma maioria silenciosa.

 Ignorada e menosprezada, essa maioria silenciosa vive na vulgaridade e na penumbra e na hora de votar abstém-se. A quase totalidade dos portugueses que constituem essa maioria silenciosa, inibidos perante a acção de uma classe política cada vez mais distante dos seus eleitos e que encaminha o País por rumos estranhos e até mesmo aberrantes, cala-se. No entanto, essa maioria silenciosa opõe uma resistência surda à acção por vezes perniciosa levada a cabo por certos elementos da classe política.

 O mundo político-mediático parece fingir não perceber este descontentamento surdo e fala de vitórias claras da Democracia.

 Mas os silenciosos desiludem e afligem os profissionais da política. Nessa maioria silenciosa poderá estar uma das chaves do nosso futuro como Nação.

 Relativamente ao candidato vencedor, não vou debruçar-me sobre a personalidade de Cavaco Silva, mas tentar apenas analisar o sentido da campanha que fez e o sentir do público a quem se dirigiu. Apelou aos valores históricos do País, falou de esperança, acenou com um espectro destruidor com o risco do radicalismo de esquerda instalado na Presidência. E a resposta de uma larga faixa da opinião pública foi clara: apostaram em Cavaco pelo que ele lhes prometeu, pelo que lhes anunciou.

 Parte considerável dos eleitores que votaram em Cavaco, viram nas suas propostas um modo de Portugal trilhar, nos tempos modernos, as vias de um sadio progresso, em continuidade com a sua História e em coerência com os valores que conformaram a sua identidade, inclusivamente os valores cristãos.

 Para Cavaco coloca-se assim um dilema: se, em coerência com o princípio da representatividade democrática travará a marcha do País rumo a uma grave crise, política, económica, social e cultural, ou continuará a dar o seu aval (como o fez em inúmeras ocasiões do seu primeiro mandato) ao programa de uma minoria radical que está a conduzir Portugal pelas vias da instabilidade e da subversão fundamental das instituições, até mesmo daquelas anteriores ao próprio Estado, como por exemplo a família.

 Se continuar a agir como o fez até agora Cavaco só fará crescer o número dos silenciosos descontentes, de que falei há pouco, e que vão engrossando o grande número dos que se abstêm.

1 comentário:

  1. Caro José, concordo plenamente com tudo o que disse com excepção de mencionar "silenciosos descontentes".

    Eu faço parte dos mais de 5 milhões de Portugueses que não votaram em nenhum destes candidatos a Chefe de Estado de Portugal.

    Mas não somos silenciosos. Somos é descontentes.
    Aliás, somos a maioria.

    Estes senhores deveriam dizer: Fui eleito pela maioria dos Portugueses que votaram.

    Em vez de dizerem todos orgulhosos " fui eleito pela maioria dos Portugueses", sou o Presidente de todos os Portugueses.

    Será que como o apoio de 25% da população de um País alguem pensa ter exito nalguma coisa.

    Ninguem deveria ser eleito para nenhum cargo publico sem o apoio minimo de 50% da população.
    Isso é o mínimo exigivel.

    Eu chamo a este tipo de regime uma ditadura da minoria.

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